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Sandra Caselato

Um caminho de harmonização com a vida: Aikido e CNV

ECOA

07/01/2020 04h00

Na adolescência minha vida perdeu a cor. Apenas tons opacos de cinza. Tudo parecia sem graça, me faltava energia, entusiasmo e o desânimo aumentava cada vez mais. Não havia nada que me dava alegria, me sentia sozinha e me questionava sobre o sentido da vida. Pensava que gostaria de desaparecer, que preferia não estar nessa vida. Não pensava em me matar, mas pensava em não estar viva. Apesar dessa sensação depressiva desesperadora, me arrastava pelos longos dias, fazendo tudo que "tinha que fazer", mesmo sem nada me interessar. 

Um dia acompanhei uma conhecida numa aula de aikido. Chegamos no final de um treino e havia três pessoas fazendo um "jiwasa" (treino livre). Elas se moviam rápido e energicamente, como uma engrenagem harmoniosa que improvisa uma dança cósmica, forte e conectada. Fiquei maravilhada com a conexão viva e quase "mágica" que presenciava. Imediatamente decidi que queria também viver aquilo. 

Demorou uns 6 meses até eu conseguir me desvencilhar da areia movediça em que estava mergulhada para chegar na primeira aula. Desde então, me apeguei aos treinos como a um barco salva-vidas que me trouxe para a superfície e impediu que me afogasse. O aikido me salvou.

De uma pessoa tímida que andava pelo mundo tentando ser invisível, interagindo o mínimo possível com as pessoas a minha volta, passei a estar mais firme e presente em meu próprio corpo e em minha própria vida. 

Vejo o aikido como uma arte de interação, que nos ensina a nos relacionarmos com a vida, com nós mesmos e com os outros, lidando melhor com tudo à nossa volta. Uma das traduções possíveis da palavra "aikido" é caminho de harmonização com a vida ou harmonização com a energia vital e universal que está presente em nós mesmos e em todas as coisas.  

Apesar de ser considerado uma arte marcial, o aikido é também conhecido como a "arte da paz". Sua proposta é resolver conflitos, transformar uma situação de ataque em que uma pessoa necessariamente ganha e outra perde (ou onde as duas saem perdendo), numa situação ganha/ganha em que o ataque é dissolvido e a integridade de todos é preservada.

Pratiquei e dei aulas por muitos anos, explorando as relações da prática física e da filosofia do aikido com aspectos da vida diária e dos nossos relacionamentos com nós mesmos, as outras pessoas, as situações da vida e do mundo.

Vi muitas pessoas muito tímidas, como eu, começando a praticar e se tornando mais assertivas e confiantes, mudando inclusive a postura corporal. Da mesma forma vi pessoas mais expansivas, explosivas e agitadas, se tornando mais calmas, centradas e tranquilas. Em todos os casos, a prática constante trazia mais equilíbrio e paz para as pessoas, além de um senso de comunidade e pertencimento decorrentes do convívio em grupo explorando como lidar com conflitos. 

O aikido foi o início do meu interesse na forma como as pessoas lidam com elas mesmas, com a vida, com as pessoas a sua volta e com conflitos em geral. Hoje não pratico nem dou mais aulas, mas dedico meu tempo a apoiar pessoas e grupos em processos de autoconhecimento e transformação de conflitos nos mais diversos ambientes e contextos, principalmente com Comunicação Não-Violenta (CNV), uma abordagem chamada por alguns de "aikido verbal". 

Para saber mais, acesse: www.sinergiacomunicativa.com.br

Sobre a autora

Psicóloga, com graduação em artes plásticas e especialização em didática, Sandra Caselato é uma exploradora dos processos psicológicos e das relações humanas, com especial interesse na transformação de conflitos e no fortalecimento da cultura de paz. Atua com desenvolvimento humano há mais de 20 anos, aprofundando-se em práticas que favorecem o diálogo, a transformação pessoal e social por meio da conexão humana.

Sobre o blog

Como você se relaciona consigo mesma(o), com as pessoas a sua volta e com o mundo? Como você lida com os conflitos que se apresentam em sua vida e ao seu redor? Sandra Caselato traz reflexões sobre como viver uma vida mais conectada com os próprios valores, enxergar com empatia além das aparências e construir espaços seguros para conversas necessárias, criando o mundo em que queremos viver.